quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

A FACULDADE DE FILOSOFIA SANTA DOROTÉIA NÃO PODE FECHAR!

PROF. RICARDO DA GAMA ROSA COSTA (RICO)

A Faculdade de Filosofia Santa Dorotéia vai fechar suas portas no final do ano de 2014, quando se formarem as últimas turmas de alunos que ainda ali estudam. Histórica instituição de ensino superior privada em Nova Friburgo, faculdade isolada, por não estar associada às grandes universidades particulares e aos grandes grupos empresarias e financeiros que se apoderaram do ensino superior nas últimas décadas, responsável pela formação da imensa maioria dos professores que atuaram e continuam atuando nas redes pública e privada da cidade e de toda a região desde 1956, experimenta seus últimos suspiros de vida. O encerramento das atividades da Faculdade representará, além da enorme carência na formação de professores e de profissionais da área de informática e de secretariado, uma perda de natureza cultural incalculável e, seguramente, comprometedora para o desenvolvimento da região.

A notícia do fechamento da Faculdade de Filosofia Santa Dorotéia caiu como uma bomba nos meios educacionais, culturais, intelectuais e artísticos de Nova Friburgo e cidades vizinhas. Afinal, a Instituição é reconhecida pelo trabalho sério e competente desenvolvido há mais de cinquenta anos em toda a região centro-norte fluminense, dedicado principalmente à formação de professores, além de ser um verdadeiro centro cultural, promotor de inúmeras atividades no campo da educação e da cultura, seminários, palestras, debates políticos (foi a primeira instituição a promover debates eleitorais nos estertores da ditadura, em 1982), peças de teatro, shows musicais, etc.

O fechamento da FFSD foi mais um desastre anunciado no ano de 2011, pródigo de tragédias na nossa cidade. Como muito disse o amigo e mestre João Raimundo, trata-se da tragédia cultural, depois do desastre climático e do caos político instalado a partir da eleição de Heródoto Bento de Mello e dos governos que o substituíram, inclusive o atual, administrações que se estruturaram sobre bases políticas incoerentes, reunindo antigos adversários, voltadas a atender os interesses fisiológicos de grupos e indivíduos, além dos lucros das empresas que mandam há décadas em nossa cidade, jamais as necessidades básicas da população.

Mas a cidade já vinha vivendo, há tempos, outra tragédia: a de ordem econômica e social, com o fechamento de indústrias, demissões, absurda rotatividade de trabalhadores nas empresas, desrespeito sistemático dos patrões aos direitos sociais e trabalhistas, redução de salários. É tristemente significativo que, no mesmo ano de 2011, em que se comemorou o centenário da indústria friburguense, justamente as três grandes fábricas que inauguraram o processo de industrialização na cidade viveram situações de falência: Rendas Arp, Ypu e Filó. Sabemos que o setor industrial representa, ainda, além dos serviços e do comércio, parte fundamental da produção de riqueza no município, mas, com exceção do ramo metal-mecânico e das indústrias têxteis que restam (como a Hak e a Sinimbu), a imensa maioria dos empregos industriais – localizados no setor do vestuário – são precarizados, com baixos salários e sem garantias plenas de direitos.

A realidade de baixos salários e desrespeito aos direitos sociais também se verifica no setor público, no comércio e na prestação de serviços. Esta tragédia social tem muita relação com o quadro de crise experimentado pela Faculdade Santa Dorotéia, pois, nos últimos anos, verificou-se a redução do número de alunos ingressantes na nossa instituição. Além da conjuntura nacional, hoje francamente desfavorável à formação de professores, em função dos péssimos salários, das precárias condições de trabalho, do assédio moral nas escolas, da violência contra o professor – apesar da propaganda enganosa do governo federal – há o quadro local de acirramento da competição entre instituições privadas, de disseminação do ensino à distância nas licenciaturas, de redução do poder aquisitivo dos trabalhadores. É preciso lembrar que os alunos da FFSD são, na sua imensa maioria, trabalhadores: professores da educação básica nas redes pública e particular, comerciários, prestadores de serviços, empregados de confecções, etc.

Numa sociedade em que as relações capitalistas avançam cada vez mais celeremente, seria inevitável, mais cedo ou mais tarde, que uma faculdade isolada como a nossa passasse a viver dificuldades para se manter. A sociedade capitalista empurra para o gueto as pequenas instituições, principalmente aquelas cujos valores e princípios orientam-se para muito além do que determina o Deus Mercado.

Nossa instituição não soube ou não quis se adaptar aos novos tempos. Resistiu enquanto pôde – graças inclusive à presença interna de um combativo grupo de professores – às imposições do capital: apesar de algumas medidas visando à diminuição de gastos (dentre as quais a mais impactante foi a mudança na grade curricular), não predominou a lógica do desrespeito sistemático aos direitos dos profissionais da educação, a exemplo das “reengenharias”, “reestruturações produtivas” e ações “empreendedoras” tão comuns em tempos de globalização neoliberal. Talvez por manter-se fiel a princípios dedicados a uma educação humanista, solidária, de um amplo espectro científico e cultural, na contramão da formação tecnicista e imediatista, voltada a atender às necessidades mercadológicas, a FFSD esteja hoje nesta situação.
No entanto, a decisão da Congregação das Irmãs de Santa Dorotéia, de não mais continuar mantendo a Faculdade e passar a se dedicar quase que exclusivamente aos colégios e à educação básica, parece justamente representar uma rendição aos imperativos do mercado, quando desistiu de seguir na resistência, sem ao menos tentar alternativas ao quadro que consumou. É o final inglório de uma bela história construída há 57 anos.

Se a Congregação simplesmente abriu mão de seguir lutando pela manutenção da histórica instituição, os professores, através da combativa atuação da Associação de Docentes e do Sinpro de Nova Friburgo e Região, buscaram promover inúmeras atividades contra o fechamento da Faculdade, tais como: assembleias reunindo os professores, funcionários e estudantes; Ato Público, em 30 de novembro de 2011, em que abraçamos simbolicamente o prédio da Faculdade e saímos em passeata pelo Centro de Friburgo; encontros com autoridades (Vereadores, Deputados, Secretários de Educação, Prefeito, Vice-Governador); audiências públicas na Câmara Municipal; manifestos, abaixo-assinado e moção aprovada na Conferência Intermunicipal da CONAE, em agosto de 2013.

A luta hoje, portanto, não é mais pela continuidade da FFSD na cidade. A Faculdade vai fechar ano que vem, isso não tem mais volta, infelizmente. Mas a luta deve continuar em defesa da federalização dos cursos da FFSD, para evitar o verdadeiro apagão na formação de professores em toda a região. Entendemos que somente uma instituição pública federal tem condições e estrutura para manter cursos voltados centralmente à formação de professores na nossa região. E cabe ao setor público garantir a oferta desses cursos, já que, para o “mercado”, não há retorno lucrativo quando se trata de investir em educação. A lógica privatista aponta para a disseminação generalizada dos cursos à distância, onde os custos são mínimos e, em contrapartida, a formação é deficiente. Somente um forte movimento popular em defesa do investimento público pesado na Educação pode reverter o quadro caótico atual. Somente retomando as mobilizações podemos pressionar o MEC a assumir sua responsabilidade na oferta destes cursos na nossa região. Em 2014, não tem jeito: é voltar às ruas pela federalização dos cursos da FFSD!


LEMBRANÇAS.... A LUTA CONTRA O FECHAMENTO DA FFSD

Em princípios de 2011, logo após a tragédia climática que atingiu Friburgo em janeiro daquele ano, nós professores e funcionários da FFSD fomos surpreendidos com a notícia que caiu como uma bomba sobre todos. Tratava-se da informação sobre o fechamento da Instituição. A condição desse fato não acontecer seria a possibilidade de uma outra Instituição Católica assumir, leia-se adquirir, os cursos desta Faculdade. Desde então, liderados por nossa Associação de Docentes, iniciamos um movimento tendo em vista evitar o pior: o fechamento da FFSD. Durante esse quase um ano de sobressaltos e incertezas realizamos diversas atividades que abaixo descrevo.

AÇÕES DOCENTES

1 – Reunião com a Direção da FFSD quando foi nos anunciado o possível fechamento e a também possível transferência para a Universidade Católica de Petrópolis;

2 – Assembleia da Associação de Docentes na sede do SINPRO Nova Friburgo, contando com a presença de um diretor do SINPRO de Petrópolis. Nesta assembleia, foi eleita uma comissão de negociação composta por todos os Coordenadores de Curso. Posteriormente, criou-se outra comissão reduzida composta pelos Professores Selma Ferro dos Santos, Ricardo Costa (Rico) e Ricardo Lengruber que, a partir deste momento, passou a funcionar como a representação legítima dos docentes.

3 – Reunidos, os professores consideraram a estratégia de manter o vestibular de 2011.

4 – Elaboração de Carta Manifesto endereçada à Direção da Província apresentando as considerações e argumentos pelo não fechamento da FFSD.

5 – Reunião de apresentação de um projeto de encampação da FFSD pelo Professor Ricardo Lengruber. O conjunto do professorado ouviu, debateu e aprovou o projeto que posteriormente foi enviado para a Irmã Provincial. Dias após, recebemos o retorno da Irmã Provincial afirmando a inviabilidade da referida proposta.

6 – Reunião da comissão de representantes dos docentes com os representantes da Província, com a direção da FFSD e com representante da UCP. Resultados:

A ) UCP vacilante;
B ) Por determinação da Província, o vestibular 2011 não seria realizado.
7 – Assembleia da Associação dos Docentes, mais os representantes do Diretório Central de Estudantes (DCE) Mário Prata e também dos funcionários: necessidade de buscar apoio da comunidade friburguense em defesa da FFSD.

8 – Publicação de reportagens, artigos, entrevistas na mídia sobre os perigos do fechamento desta instituição de ensino.

9 – Criação de um abaixo-assinado virtual em defesa da Faculdade Santa Dorotéia: obtivemos, naquele momento, em torno de duas mil assinaturas.

10 – Realização de reunião quando decidimos pela confecção de camisetas com o sloganA FFSD NÃO PODE ACABAR”.

11 – Em 30 de novembro de 2011, realizamos uma Assembleia na Cantina da FFSD, com a presença de representantes dos poderes municipais: vereadores, Secretário de Educação, etc. A seguir, realizamos um ato público com um “ABRAÇO SIMBÓLICO” ao prédio da FFSD. Contamos com um número muito expressivo de participantes e imprensa local. Não devemos esquecer que durante o “abraço” o Coral ANIMA entoou canções, tornando o evento emocionante.

12 – Realização de uma passeata pelas ruas do centro de |Nova Friburgo no dia 30 de novembro, logo após o ato público.

13 – Ida a São Paulo da comissão de representantes dos professores para reunir-se com a Madre Provincial e demais representantes da Congregação de Santa Dorotéia.

14 – Reunião dos professores onde foi lida a resposta assinada pela Madre Provincial confirmando taxativamente o encerramento da FFSD em 2014.

15 – Reunião promovida pela Associação dos Docentes na sede do SINPRONF com a advogada deste, a Dra. Iraceli, tendo em vista a explanação de todos os nossos direitos trabalhistas. Naquele momento foi aprovada a proposta de solicitar à Direção da FFSD um plano de encerramento da instituição até 2014.

16 – Assembleia dos Docentes tendo em vista encaminhar à direção da FFSD nossa proposta do reajuste salarial 2012/2013.

17 - Assembleia dos Docentes de avaliação da contraproposta salarial enviada pela direção da FFSD.

18 - Aprovação, em agosto de 2013, na Plenária Intermunicipal da CONAE, em Nova Friburgo, de Moção de Apoio à luta pela federalização dos cursos da FFSD.


AÇÕES DOCENTES JUNTO À INICIATIVA PRIVADA

18 – Reunião do Professor Ricardo Lengruber com Dom Ednei, Bispo de Nova Friburgo.

19 – Reunião na sede da UCP em Petrópolis com o Reitor daquela Universidade. A Professora Selma Ferro representou os docentes da FFSD.

20 – Reunião da direção da FFSD, representantes da AD, com o representante da UCAM/NF, tendo em vista a proposta de encampação da FFSD por esta Universidade.

21 – Reunião da direção da FFSD e representantes da AD com o representante da Universidade São Camilo (ES).

AÇÕES DOCENTES JUNTO A INSTITUIÇÕES PÚBLICAS

22 – Reunião dos representantes da AD com o então Secretário Municipal de Educação Marcelo Verly.

23 – Reunião com o Prefeito Municipal em Exercício de Nova Friburgo, Sérgio Xavier.

24 - Reunião com o Deputado Federal Glauber Braga.

25 – Reunião com o Deputado Estadual Comte Bittencourt, Presidente da Comissão de Educação da ALERJ.

26 – Reuniões com o Governador em Exercício Luiz Pezão e com o Secretário Estadual de Ciência e Tecnologia.

27 – Conversa telefônica do Professor João Raimundo com o Reitor da UERJ Professor Dr. Ricardo Vieiralves de Castro.

28 – Audiência Pública, em 08 de fevereiro de 2012, na Câmara Municipal de Vereadores de Nova Friburgo, promovida pelo vereador Marcelo Verly contando com a presença de outros vereadores, representantes de outras instituições de Educação do Município, alunos, professores e ex-professores da FFSD.

29 – Reunião com a assessoria do Deputado Estadual Rogério Cabral.

30 – Reunião com a direção do CEFET-NF que demonstrou interesse em levar ao MEC uma proposta de assumir os cursos da FFSD.

31 – Recebimento e avaliação pelos professores do projeto do CEFET-NF para federalização da FFSD enviada ao MEC.

32 – Nova audiência pública na Câmara Municipal: em 22 de novembro de 2012, convocada pelo Vereador Marcelo Verly, na qual a representante do CEFET de Nova Friburgo, Profª Fernanda Rosa dos Santos, anunciou o interesse da instituição em encampar os cursos da FFSD, para o que propunha a formação de uma comissão responsável pela elaboração de projeto a ser enviado pelo MEC.

33 – Reunião no CEFET de Nova Friburgo com a Diretora Fernanda Rosa, Ricardo Costa (Associação de Docentes) e Vereador Pierre de Moraes, para dar andamento ao projeto acima citado. Encaminhamento do projeto ao MEC.

34 – Reunião do Deputado Federal Glauber Braga na Faculdade, no início de 2013, com a presença da Irmã Celma, diretores da AD/FFSD, Vereador Anderson Nogueira e assessores, para relatar sobre as conversações feitas pelo deputado junto ao MEC e ao CEFET, no sentido da encampação da FFSD, para o que seria necessário imóvel próprio do CEFET em Nova Friburgo. Solicitação, após esta reunião, de audiência com o Prefeito recém-eleito Rogério Cabral, para estudos sobre a viabilidade de a Prefeitura ceder imóvel ou terreno para a iniciativa, tendo em vista que o prédio que hoje abriga o CEFET ser estadual, e não haver, por parte do Governo do Estado, interesse em repassá-lo à esfera federal.

35 – Realização de Audiência Pública na Câmara Municipal, em 17 de maio de 2013, desta vez convocada pelo Vereador Cláudio Damião, com a presença dos Deputados Federais Jorge Bittar e Glauber Braga, assim como da representação do CEFET, em que foram reafirmadas as intenções de encampação dos cursos da FFSD pela instituição federal, cujo propósito maior é de se transformar em universidade. Ausência da representação do governo municipal, apesar de terem sido convidados os senhores prefeito e secretário municipal de Educação.

O levantamento de todas essas ações é o resultado de um exercício de memória feito pelos Professores João Raimundo de Araújo e Ricardo Costa.